
A inteligência artificial não está mais batendo à porta das nossas escolas — ela já entrou. Está presente na sala de aula, na sala dos professores e no escritório da equipe gestora. Para muitos educadores, este momento pode ser vivido com um misto de entusiasmo e apreensão. Será que a IA é a solução para os desafios mais urgentes da educação? Ou será que ela ameaça enfraquecer as conexões humanas, que são o coração do ensino?
A verdade é que a IA não é nem uma varinha mágica nem o fim da educação como conhecemos. Assim como qualquer ferramenta poderosa, o impacto da IA dependerá da imaginação, da sabedoria e do discernimento com que decidirmos utilizá-la.
Este é um convite — ou melhor, um chamado — para que educadores e líderes escolares pensem com profundidade, ajam com intencionalidade e jamais se esqueçam de que o trabalho mais essencial da educação será sempre um trabalho humano.
As Narrativas que Contamos Sobre a IA Fazem Diferença
A forma como imaginamos a inteligência artificial influencia diretamente como lidamos com ela. Muitos de nós crescemos com imagens de IA tiradas da ficção científica — robôs simpáticos como o R2-D2 de Star Wars ou a Rosie dos Jetsons; ou ameaçadores como o Exterminador do Futuro ou o Agente Smith da Matrix. Essas imagens culturais até servem como ponto de partida, mas não são suficientes para nortear nossa prática pedagógica. Elas tendem a simplificar demais a IA — ora como salvadora, ora como vilã.
Em vez disso, precisamos de histórias mais robustas, que nos convidem a enxergar a IA como uma ferramenta — uma ferramenta potente e potencialmente transformadora, sim — mas que exige criatividade, empatia e ética humanas para ser bem utilizada.
As Escrituras oferecem exatamente essa lente: nos revela tanto a bondade da criação quanto a profundidade da queda, apontando que somente a beleza da obra redentora de Cristo é a única solução para os efeitos generalizados do pecado. Ao compreendermos a grande narrativa bíblica — criação, queda, redenção e restauração — ganhamos maior clareza sobre quem somos e para quê fomos criados como seguidores de Cristo.
Fomos chamados a ser mordomos da criação, fazer discípulos e trabalhar pela restauração e pelo florescimento da vida no mundo. Esse chamado não é suspenso quando acessamos uma nova plataforma com IA — na verdade, essa responsabilidade se intensifica, especialmente quando lidamos com crianças e adolescentes. Temos a oportunidade e a missão de ajudá-los a enxergar sua história dentro da história de Deus — e a discernir como responder às questões complexas do nosso tempo, incluindo o uso ético e sábio da IA.
O Principal Precisa Continuar Sendo o Principal
Diante dessa responsabilidade tão grande, precisamos enxergar o ensino como um ato intencional — construindo experiências, conduzindo investigações e criando ambientes que favoreçam o aprendizado verdadeiro. Precisamos levar a sério essa missão!
Acredito que, na era da IA, devemos valorizar ainda mais aquilo que é essencialmente humano no ato de ensinar. A IA pode ser útil em diversos aspectos da prática docente — como sugerir planos de aula, gerar ideias de atividades, elaborar critérios de avaliação, entre outros. Mas ela não consegue fazer o trabalho profundo, relacional e adaptativo de conhecer cada aluno, perceber o clima da sala e ajustar a aula em tempo real. Tampouco pode experimentar a alegria de ver o brilho nos olhos de um aluno ao fazer uma descoberta significativa.
Ensinar vai muito além de repassar conteúdo. Se reduzirmos o ensino à simples transmissão de informações, corremos o risco de supervalorizar o que a IA pode fazer e desvalorizar a arte humana da educação. Precisamos de humanos fazendo o trabalho que só humanos podem fazer!
E que trabalho humano é esse? É ouvir com atenção, perceber sinais sutis, responder com empatia. É construir confiança para que os alunos se sintam seguros ao correr riscos intelectuais. É contar histórias que revelam o sentido por trás dos fatos. Uma educação cristã autêntica forma pessoas integrais — corpo, mente e espírito — não apenas entrega conteúdos.
Esse trabalho humano também é moral: exige que perguntemos, não apenas “Podemos fazer isso?”, mas “Devemos fazer isso?” em nossas salas de aula e instituições. Essa é uma pergunta que todo educador cristão precisa levar a sério. Não devemos adotar novas tecnologias apenas porque são modernas, embora essa tentação seja real. Elas precisam promover o florescimento humano.
Cultivando uma Imaginação para a IA
Se quisermos usar a IA de maneira sábia, precisamos cultivar uma imaginação enraizada na esperança, não no medo. Isso significa perguntar:
- Como a IA pode nos ajudar a ter mais tempo para construir relacionamentos, aliviando tarefas administrativas?
- Como pode nos apoiar na personalização do ensino, respeitando as necessidades individuais dos alunos?
- Como ferramentas com IA podem ajudar os alunos a explorar ideias, formular melhores perguntas e criar com mais profundidade?
- Como a IA pode ser usada no esforço de restauração que os cristãos são chamados a fazer, seguindo o caminho de serviço de Jesus?
Mas também precisamos imaginar os riscos, para que possamos vigiá-los com prudência: dependência da IA para pensar, perda de habilidades críticas ou até atalhos éticos que comprometem o aprendizado. Neste mundo manchado pelo pecado, esses são, infelizmente, problemas reais.
Um Chamado à Coragem e à Esperança
A era da inteligência artificial vai testar nossa capacidade de adaptação como educadores. Certamente teremos que rever muitas suposições antigas sobre como trabalhamos. Mas essa nova realidade também nos oferece possibilidades notáveis, se formos guiados por imaginação, sabedoria e coragem.
Professores e líderes escolares, não estamos sendo substituídos! O coração do nosso trabalho — ensinar com amor, servir com integridade e discipular com intencionalidade — não pode ser automatizado. A IA pode até executar tarefas, mas jamais poderá encarnar cuidado, inspirar confiança ou modelar caráter. Esse é o trabalho humano insubstituível que levamos conosco todos os dias à escola.
Portanto, ao explorarmos a IA em nossas práticas, busque sabedoria acima da novidade, formação acima da informação. Deixe sua imaginação ser moldada por histórias de esperança e restauração. E confi que, com discernimento, podemos usar a IA não para diminuir o aspecto humano da educação, mas para elevá-lo.
Nosso objetivo final deve ser glorificar a Deus servindo nossos alunos com excelência, utilizando os recursos disponíveis com criatividade, sabedoria e responsabilidade.
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Sobre o autor
Dr. Dave Mulder é professor de Educação na Dordt University (EUA), onde atua nas áreas de tecnologia educacional, ensino de STEM e fundamentos da educação. Com formação como professor de Matemática, Ciências, Bíblia e Tecnologia em escolas cristãs, e doutorado em tecnologia educacional, ele busca traduzir pesquisas acadêmicas em práticas aplicáveis da Educação Infantil ao Ensino Superior. É autor do livro Always Becoming, Never Arriving: Developing an Imagination for Teaching Christianly e está finalizando um novo livro sobre o uso da IA por educadores cristãos.

